Política:a história do jovem que está sendo processado por ter cuspido num militar...

Quarta Feira, 23 de Janeiro de 2013


“Eu não me arrependo do cuspe, porque eles também não se arrependem do que fizeram na ditadura”

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Felipe Garcez está sendo processado
pelo Clube Militar por “constrangimento
ilegal”. Ele foi flagrado cuspindo em um
militar que comemorava o golpe de 64.
Foto: Ana Helena Tavares
29 de Março de 2012 foi um daqueles raros momentos em que a esquerda se uniu. Centenas de militantes das mais variadas tendências, em sua maioria jovens, se reuniram em frente à sede do Clube Militar, no Rio de Janeiro, para protestar contra o que ocorria lá dentro. Algumas dezenas de militares, em sua maioria idosos, celebravam os 48 anos do dia 31 de Março de 1964. Dia em que, para eles, ocorreu uma “revolução”.
“Eu milito na área dos Direitos Humanos e, quando a gente ficou sabendo que os militares iam festejar o golpe, eu me senti na obrigação pessoal de estar lá e protestar. Aí, nós combinamos pelo Facebook, e não imaginávamos que seria o que foi. Não houve organização prévia. Eu chamo essas atividades de “Flash Móvel”, foi espontâneo: um contou pro outro, que contou pro outro e, assim, aconteceu. Cresceu mais do que a gente.”, relatou, em entrevista exclusiva para o “Quem tem medo da democracia?”, o jovem de 22 anos Felipe Garcez.
Flagrado cuspindo
Garcez foi fotografado, naquele dia, cuspindo na direção de um militar que participava da comemoração. A foto, da Agência Estado, foi publicada, na época, no site da Veja, por Reinaldo Azevedo, que chamou Garcez e seus colegas de “baderneiros”. O fato de o cuspe ter sido registrado lhe rendeu um processo na Justiça, onde aparece como autor.
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 “Eles alegam tipificação de “constrangimento ilegal”. Também pelo cuspe, mas não só por isso. Por todo o ato. Pelos ovos que jogaram. Pelos xingamentos que eles alegam que tiveram. Por toda a situação, que eles dizem que eu sou o responsável. O que é uma insanidade dizer que eu sou o responsável. Outras pessoas estão arroladas junto, mas só estão sendo investigadas. O Clube Militar, que foi quem pediu a abertura de inquérito, me coloca como autor. Eu e mais quatro pessoas, se não me engano. Alguns meus amigos. Posso citar o Ádio, Eduardo Beniacar, Matheus Aragão, que conheço só de vista, e o Silvio Tendler (cineasta, que nem estava presente).”
Sem arrependimentos
“A nossa idéia nunca foi ir para lá agredir eles. A nossa idéia foi protestar mesmo. Porque é uma situação em que os caras debocham. Eles dizem assim: ‘Não matamos comunistas, matamos porcos. Tinha que matar mesmo. Fizemos pelo Brasil’. Eram frases ditas para a gente. É claro que eu não queria que tivesse chegado a isso, mas eu não me arrependo (do cuspe), porque eles também não se arrependem do que fizeram (na ditadura). O pessoal levou fotos (dos desaparecidos políticos) e eles (os militares) apontavam para elas e diziam: ‘Matei! Matei mesmo!’ Então, no dia que eles disserem que se arrependem disso, eu direi que me arrependo do cuspe.”
O militar em quem Garcez foi fotografado cuspindo é o Coronel-aviador Juarez, presidente do Ternuma, grupo de extrema-direita chamado “Terrorismo Nunca Mais”. “É um grupo que defende a ditadura. Não é ele quem está me processando. Eles se utilizaram do Clube Militar para isso, mas ele está relacionado como uma das vítimas. Como também o Coronel Batista, do Exército, e o cara que matou Lamarca (General Cerqueira). Eles estavam todos lá e estava também a família Bolsonaro, que é toda estranha. Muita gente cuspiu e vários deles foram cuspidos. Eles nunca tinham passado por aquilo.”
“Ele disse que devia ter matado o meu pai”
“No Cel. Juarez eu nem cheguei a cuspir. O que eu tentei foi evitar que ele chegasse a mim. Ele veio para me agredir. Ele disse que devia ter matado o meu pai. Tinha um monte de gente dizendo para ele: ‘Você matou comunistas’. E ele me disse: ‘Devia ter matado o seu pai’. Então, para mim, foi uma reação, legítima defesa.” O pai do jovem estava presente à entrevista e, paradoxalmente, se diz um homem de direita.
Garcez conta que não estava em casa quando a polícia levou intimação para ele depor na 5ª DP, em 10 de Janeiro de 2013, e que se impressionou com a forma de abordagem: “Eu senti que a própria polícia queria me intimidar, pois não fazia sentido nenhum eles mandarem 3 viaturas para me entregar um papel. E bateram de casa em casa dos meus vizinhos. E trataram eles mal, falando com eles de fuzil na mão. Foram brutos. Mas, na delegacia, o inspetor de polícia que me recebeu estava bem tranquilo, me tratou muito bem e me deixou bem à vontade.”
Um caso de política
“Ele próprio me disse: ‘o caso de vocês não é caso de polícia, é caso de política. Até o governador já ligou para cá querendo saber que processo é esse que envolve o Silvio Tendler.’ Então, creio que eles se acalmaram depois da repercussão à intimação do Tendler. Porque, segundo o inspetor que me interrogou, depois que o processo dele (do Tendler) chegou à delegacia, até o Comando Militar do Leste, militares da ativa, passaram a acompanhar o caso. E houve uma repercussão nacional.”
“Nós recebemos muitas ameaças e alguém, não sei quem, mandou um e-mail para o senador Eduardo Suplicy falando sobre essas ameaças. O senador enviou um ofício para o ministro da Justiça. E o ministro abriu um processo na Polícia Federal em proteção à gente. Este processo foi anexado ao nosso, com parecer do ministro e do senador Suplicy em defesa da gente. Então, o próprio inspetor me disse: ‘O caso de vocês é muito preocupante. Isso deu uma merda em Brasília, estão fazendo reuniões e acho que isso vai ser arquivado”.
“Constrangimento ilegal”
O Clube Militar processa por “constrangimento ilegal”, mas, segundo o advogado de Felipe, membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, uma instituição não pode processar ninguém por “constrangimento ilegal”. Só quem pode se sentir “constrangida” é uma pessoa física. Segundo Felipe, o advogado acredita que “o processo foi feito para aterrorizar, porque juridicamente eles não vão conseguir nada”. “O patrimônio do Clube não foi depredado, a instituição não foi invadida. Os militares puderam entrar e sair livremente. Alguns alegam que (o protesto) os atrapalhou, mas o evento ocorreu tranquilamente. Eles ficaram lá tomando o seu coquetelzinho e chamando de ‘Revolução de 64’…”
Ao que tudo indica, o “coquetelzinho” pode se repetir em 2013, quando o golpe completará 49 anos. “Há depoimentos dos militares, que foram depor como vítimas, em que eles dizem que farão de novo a comemoração e que neste ano o Comando Militar do Leste fará a segurança do Clube Militar. A gente vai contestar isso na justiça. Porque a Dilma proibiu a comemoração. Se a Dilma proibiu, os militares da ativa não podem se meter nisso. Só os reformados”.




Fonte:Blog Contexto Livre ( Conversa Afiada )
íntegra da matéria em  http://contextolivre.blogspot.com.br/2013/01/eu-nao-me-arrependo-do-cuspe-porque.html

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