Artigo: O Princípio do Promotor Natural

Sexta Feira, 21 de Dezembro de 2012



 
Muita dúvida surgiu em relação ao reconhecimento explícito do denominado princípio do promotor natural, garantia indispensável e que encontra inegável reconhecimento na Constituição de 1988.
 
Além de ser julgado por órgão independente e pré-constituído, o acusado também tem o direito e a garantia constitucional de somente ser processado por um órgão independente do Estado, vedando-se, por consequência, a designação arbitrária, inclusive, de promotores ad hoc ou por encomenda (art. 5.º, LIII e art. 129, I, c/c o art. 129, § 2.º).
 
Na doutrina, o tema foi bastante debatido, chegando alguns autores a defendê-lo antes mesmo da atual Constituição, destacando-se, pioneiramente, Hugo Nigro Mazzilli, Jaques de Camargo Penteado, Clóvis A. Vidal de Uzeda e Paulo Cesar Pinheiro Carneiro.
 
A CF/1988 assegura que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente (art. 5.º, LIII).
 
Depois de muito debate, a Suprema Corte aceitou a ideia de promotor natural, recomendando-se a discussão no leading case, que foi o HC 67.759.
 
Em referido julgamento, o Min. Celso de Mello estabeleceu que “o postulado do Promotor Natural, que se revela imanente ao sistema constitucional brasileiro, repele, a partir da vedação de designações casuísticas efetuadas pela Chefia da Instituição, a figura do acusador de exceção. Esse princípio consagra uma garantia de ordem jurídica, destinada tanto a proteger o membro do Ministério Público, na medida em que lhe assegura o exercício pleno e independente do seu ofício, quanto a tutelar a própria coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas o Promotor cuja intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e predeterminados, estabelecidos em lei. A matriz constitucional desse princípio assenta-se nas cláusulas da independência funcional e da inamovibilidade dos membros da Instituição. O postulado do Promotor Natural limita, por isso mesmo, o poder do Procurador-Geral que, embora expressão visível da unidade institucional, não deve exercer a Chefia do Ministério Público de modo hegemônico e incontrastável” (HC 67.759, Rel. Min. Celso de Mello, j. 06.08.92, Plenário, DJ de 1.º.07.93).
 
Em igual sentido, buscando o fortalecimento institucional do Ministério Público, o STF reconheceu o referido princípio e seus desdobramentos:a. garantia de não sofrer arbitrária persecução penal instaurada por membro do Ministério Público designado ‘ad hoc’ e b.intensificação das prerrogativas de independência funcional e deinamovibilidade dos integrantes do ‘Parquet’: HC 102.147, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, j. 16.12.2010, DJE de 03.02.2011.
 
Buscando sistematizar, a doutrina avança e, conforme ensina Carneiro, a garantia do promotor natural passa, necessariamente, por quatro exigências básicas: “pessoa investida no cargo de promotor; existência de órgão de execução; lotação por titularidade e inamovibilidade do promotor do órgão de execução, ressalvadas as hipóteses legais de substituição e remoção; definição em lei das atribuições do cargo” (P. C. P. Carneiro, O Ministério Público no processo civil e penal — promotor natural: atribuição e conflito, p. 96).
 
A jurisprudência do STF, por sua vez, vem enfrentando e reconhecendo a referida garantia, destacando-se os seguintes julgados:
 
A) HC 92.885 – j. 29.04.2008: pedido de arquivamento dos autos do inquérito policial por um promotor de justiça e oferta da denúncia por outro: não violação ao princípio do promotor natural.
 
B) HC 102.147 – j. 16.12.2010: ocorrência de opiniões colidentes manifestadas, em momentos sucessivos, por procuradores de justiça oficiantes no mesmo procedimento recursal: após interposição do recurso em sentido estrito, determinado procurador de justiça emitiu parecer pelaimpronúncia. Contudo, na sessão de julgamento, um outro procurador de justiça se manifestou no sentido do improvimento do recurso econfirmação da sentença de pronúncia. O STF admitiu a ocorrência de opiniões colidentes nos termos da autonomia intelectual que qualifica a atuação do membro do Ministério Público, dando sentido aos princípios constitucionais da unidade e da indivisibilidade.
 
Na parte conclusiva de seu voto, o Min. Celso de Mello, avançando e ampliando o tema, observa que o princípio do Promotor Naturalimpede o arbitrário afastamento do membro do Ministério Público do desempenho de suas atribuições nos procedimentos em que ordinariamente oficie (ou em que deva oficiar), exceto:
 
– “por relevante motivo de interesse público”;
 
– “por impedimento ou suspeição”;
 
– “por razões decorrentes de férias ou de licença”.
 
C) HC 103.038 – j. 11.10.2011: designação, pelo Procurador-Geral de Justiça, de outro promotor, com a concordância do promotor de justiça titular, para funcionar em feito determinado, de atribuição daquele: aplicação dos arts. 10, IX, “f” e 24 da Lei n. 8.625/93 (LONMP). Tendo em vista a situação concreta de complexidade do feito e consentimento do promotor titular, o STF entendeu não haver violação ao princípio do promotor natural. Esse ato de designação deverá ser, naturalmente,motivado e dentro de critérios de razoabilidade, reprimindo substituições imotivadas ou por inaceitável e combatida encomenda.
 
D) ADI 2.913 – j. 20.05.2009: propositura da ação penal nos casos previstos no art. 105, I, “a”, CF/88, pelo Procurador-Geral da República perante o STJ. Possibilidade de delegação dessa competência a Subprocurador-Geral da República. O STF, por maioria, entendeu ser perfeitamente possível a ampliação de atribuições do PGR nos termos doart. 128, § 5.º, CF/88, qual seja, por meio de lei complementar, notadamente, pela LC n. 75/93, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União e que admite explicitamente tal competência e sua delegação nos termos de seu art. 48, II.
 
Diante de todo o exposto, não temos dúvidas que o princípio do promotor natural se apresenta como indispensável garantia e direito fundamental, não podendo ser desprezado ou negado, sob pena de se enfraquecer não apenas a instituição do Ministério Público, como, acima de tudo, gerar insegurança e risco para a sociedade.
 
Por Pedro Lenza, Mestre e Doutor pela USP, Advogado e Professor do Complexo Jurídico Damásio de Jesus.
 






Fonte:/Blog Promotor de Justica
extraído na íntegra

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

TJ-RJ Dá Posse a Jovem Desembargadora Em Vaga da OAB

FAMOSOS Após hacker vazar nude de Luísa, Whindersson faz piada, mas lamenta: “Danos irreparáveis”

Dois alvos: a história da mulher que prometeu ficar nua e a mosca que pousou na testa de Obama...