Demóstenes: Cassado os Direitos Políticos Por 56 X 19

Quarta Feira, 11 de Julho de 2012


Por 56 votos a 19, o senador perdeu o mandato nesta quarta-feira. Foi uma pena adequada: antes de sua abrupta metamorfose, ele certamente pediria a cassação de um político que se aliasse à contravenção

Gabriel Castro
Senador Demóstenes Torres na votação da cassação do seu mandato
Senador Demóstenes Torres na votação da cassação do seu mandato - Cadu Gomes/Reuters
O ex-senador Demóstenes Torres, que cinco meses atrás era tido como um dos nomes mais promissores da política nacional, ficará fora da vida pública por pelo menos 16 anos. E não poderá culpar ninguém a não ser a si mesmo: ao se envolver com o notório contraventor Carlinhos Cachoeira, o parlamentar traiu o eleitorado de forma irreconciliável. Foi cassado nesta quarta-feira por 56 votos a 19. Houve cinco abstenções.
Quando o resultado foi anunciado, o agora ex-senador não deixou transparecer qualquer emoção e saiu do plenário rapidamente sob a proteção de seguranças. Nem ele nem o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, deram declarações à imprensa. Era o fim de um mandato que teve início em 2003.
Ao longo da sessão desta quarta-feira, o senador ouviu apenas discursos favoráveis à sua puniçãoTentou se defender atacando o relator Humberto Costa (PT-PE), mas o resultado foi inóquo. O placar ficou dentro do esperado. Demóstenes foi expulso do DEM, não integra a base governista e, para piorar a situação, colecionou desafetos em sua passagem pelo Senado. Os votos a favor dele só confirmaram a tese de que há um grupo que é contra a punição de qualquer colega, por qualquer motivo.
Desde que o escândalo Cachoeira surgiu, o meio político assistiu a uma das mais radicais metamorfoses já testemunhadas. O senador probo, implacável defensor da ética, promotor de Justiça, opositor ferrenho do governo, que uma ala do DEM sonhava em lançar à Presidência da República já em 2014, saiu de cena abruptamente.
Entrou um parlamentar sombrio, evasivo, defensor do corporativismo e crítico de um modelo acusatório que ele mesmo ajudou a alimentar. Um homem do qual o DEM se livrou rapidamente para poupar a própria imagem. Em certa medida, os dois Demóstenes eram na verdade um só. A diferença é que o senador sem decoro nunca aparecia à luz do sol. 
Em 6 de março, ainda no início do escândalo Cachoeira, já havia surgido na imprensa interceptações telefônicas mostrando a relação próxima entre Demóstenes e Cachoeira. O senador subiu à tribuna e garantiu aos colegas que tudo não passara de um mal-entendido acrescido de uma dose de azar. Disse que não sabia da atividade ilegal de Cachoeira e garantiu que não quebrou o decoro. Até então, Demóstenes tinha capital político suficiente para ganhar um voto de confiança dos colegas. Todos os 44 senadores presentes se manifestaram a favor de Demóstenes.
Mas, dias depois, uma torrente de reportagens começou a revelar a verdadeira postura do senador: um lobista da quadrilha, que usava o mandato para atender aos interesses de Cachoeira e recebia vantagens da quadrilha.
O personagem se desfez desde então. Surgiu um Demóstenes silencioso, introspectivo, avesso à imprensa, sofista, crítico da "ditadura da mídia" e defensor do corporativismo no Senado. O homem que acusava de forma incisiva passou a citar aspectos técnicos para se defender, sem responder de forma satisfatória ao mérito das acusações que lhe foram imputadas.
O novo Demóstenes preferiu se calar na CPI do Cachoeira, quando convocado a depor. Foi obrigado a ouvir um áspero discurso do deputado Sílvio Costa (PTB-PE), que lhe apontou o dedo e o classificou como "hipócrita" e "mentiroso". Agora, o parlamentar goiano será forçado a se afastar da política por ao menos oito anos. 
O longo silêncio foi interrompido por uma série de discursos em plenário. Nos últimos oito dias, foram oito pronunciamentos. O principal dele, na sessão desta quarta-feira, acabou se transformando no último ato de Demóstenes Torres como senador.
Ironia das ironias: não fosse a Lei da Ficha Limpa, da qual Demóstenes foi relator na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, o agora ex-senador conseguiria renunciar mantendo os direitos politicos, o que lhe permitiria disputar novas eleições já em 2014. Mas, pela nova regra que ele mesmo ajudou a construir, a renúncia tão nociva quanto a cassação. A solução foi enfrentar o processo por quebra de decoro. Agora, o ex-senador só retomará os direitos políticos em 2027. E só poderá disputar uma eleição em 2028.



Fonte: Veja.abril.com.br
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