Ponto de Vista: Pode um delegado de Polícia soltar uma preso com prisão temporária decretada e antes do término do prazo da ordem judicial ?
Quarta feira, 26 de Janeiro de 2022
Por Tom Oliveira *
Meus amigos,
Esta semana nos deparamos com a manchete da prisão temporária decretada pelo Justiça de um empresário local por crime de Homicídio. O caso estampou páginas de sites e jornais, sobretudo porque, após o depoimento do indiciado , o delegado de polícia entendeu " não existir razões para a manutenção da prisão temporária e liberou o suspeito, sem nem consultar o magistrado.
Sabemos que a Lei nº 7.960/89 diz que o encarceramento temporário do averiguado pode se dar quando imprescindível as investigações do inquérito policial, mediante expedição de mandado de prisão pelo magistrado, bem como de que decorrido o prazo da detenção o averiguado deve ser libertado imediatamente. No caso em apreço, a notícia informa que o averiguado teria dito que apenas forneceu o veiculo para que os autores levassem os meliantes para outro local. Em razão disso, não raramente, o delegado de polícia, quando de posse de prova contundente de que o averiguado não teve participação na empreitada delituosa, expede alvará de soltura determinando sua liberação antes do término do prazo estabelecido no mandado de prisão. Eis o imbróglio, tendo em vista que quem decretou a ordem foi o juiz competente.
Ouvido em reportagem do portal GP1, o experiente Delegado de Polícia Francisco Costa, o Bareta, manifestou-se contra a posição do colega de profissão:
"Sou contrário à soltura pois foi um crime hediondo, homicídio e ocultação de cadáver. A participação do indivíduo preso é clara, portanto, deixaria para o juiz revogar a medida cautelar " ( a prisão ).
Penso que a questão toda se dá porque o prazo de 5 dias da prisão temporária decretada pelo juiz ainda estava em vigor, e o delegado de polícia não é o magistrado para decidir sobre a soltura de preso determinada judicialmente, ainda que, reconheça-se, na qualidade de presidente do Inquérito Policial, tem o delegado de Polícia condições de apreciar a necessidade ou não da manutenção do cárcere. O imbróglio todo, a meu sentir, é porque a legislação é omissa sobre a necessidade de expedição de alvará judicial para a libertação de preso temporário antes do término do prazo, pela autoridade policial.
In casu, recomenda-se que o delegado encaminhe ofício ao juiz do feito comunicando a sua posição jurídica, o qual decidirá, ouvindo o representante do Ministério Público, exatamente porque, quando o juiz decretou a temporária, ele teve o parecer do promotor de justiça pela anuência, consoante reza o disposto no artigo 2º, I, da Lei 7.960, de 21.09.1989, que dispõe sobre Prisão Temporária, verbis:
Art. 2° A prisão temporária será decretada pelo Juiz, em face da representação da autoridade policial ou de requerimento do Ministério Público, e terá o prazo de 5 (cinco) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade.
§ 1° Na hipótese de representação da autoridade policial, o Juiz, antes de decidir, ouvirá o Ministério Público.
O CPP - Código de Processo Penal, por sua vez, determina que:
Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
Como o delito investigado integra a relação de crimes hediondos, como dito pelo delegado Bareta, mais um motivo para o delegado competente ( o do Inquérito investigativo ), peticionar ao juiz pela liberdade do cautelado temporariamente( o preso ), porque a legislação determina nestes casos, na forma do disposto no § 4º do Art. 2º, que a prisão temporária será decretada pelo juiz e terá prazo de 30 dias, em caso de extrema e comprovada necessidade, sendo possível sua prorrogação uma vez mais por igual período.
No Brasil ( e na maioria da nações ), a liberdade é a regra, a prisão é exceção, ótimo para réu primário, e de bons antecedentes, aguardar o julgamento em liberdade. Juiz de direito e Delegado de Polícia ( com o RMP, no meio, ) são duas autoridades, uma policial e a outra jurídica. O delegado de polícia com formação jurídica garante que a apuração de crimes evolua sem qualquer violação da lei ou de direitos, assegurando, destarte, que as provas e elementos de informações produzidos nesta fase da persecução penal possam subsidiar o titular da ação penal ( O Promotor de Justiça ) e até a decisão final do magistrado. Não custa lembrar: ao juiz compete julgar, ao promotor, compete defender os interesses da sociedade. Na área criminal, atua no combate à criminalidade e na fiscalização das penas, garantindo que sejam aplicadas de forma correta aos infratores. É o responsável por lei para oferecer acusação (denúncia). Na área civil, ele defende os chamados interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis, como o direito à vida, à saúde e à educação, o direito dos consumidores, o direito a um meio ambiente sadio, por exemplo e é o órgão que detém o controle externo da atividade policial. O Delegado de Polícia, por sua vez, é o chefe da Polícia Investigativa, também chamada de Polícia Judiciária. Suas principais tarefas são comandar investigações e desvendar crimes, possibilitando dessa forma a punição dos infratores. É função do Delegado de Polícia determinar, por exemplo, quais diligências devem ser feitas para esclarecer os fatos. Eis as diferenças basicas, ressalvando que não é competência do delegado decidir por liberdade de preso, havendo decisão judicial, por melhor que seja a intenção.
* O autor é promotor de justiça aposentado ( MP-PI )
fontes: https://www.gp1.com.br/pi/piaui/noticia/2022/1/26/baretta-critica-soltura-do-dono-do-frango-potiguar-foi-um-crime-hediondo-518453.html?highlight=54231
https://carlosbenedetti.jusbrasil.com.br/artigos/129732600/a-autoridade-policial-pode-libertar-o-preso-temporario-antes-do-termino-do-prazo-sem-alvara-judicial
https://blog.alfaconcursos.com.br/qual-a-diferenca-entre-as-funcoes-de-juiz-promotor-e-delegado/
Imagem de: papodehomem.com.br
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