Ponto de Vista: A auditoria de funcionamento atualmente nas urnas eletrônicas e o voto impresso-auditável, como quer Bolsonaro

 Segunda Feira, 12 de Julho de 2021


Por  Tom Oliveira *


Meus amigos,

O debate político do momento , além das reverberações cotidianas de Bolsonaro, está em torno do voto impresso-auditável desejado pelo governo e transformado na PEC 135/2019, da Deputada Federal Bia Kicis, que pretende realizar uma mudança significativa no sistema eleitoral brasileiro com a inclusão de cédulas de papel junto as urnas eletrônicas, transformando-o no já  popularmente debatido voto impresso-auditável. Em síntese, acrescenta o parágrafo 12 no artigo 14 da CF, verbis:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

(…)

§ 12 No processo de votação e apuração das eleições, dos plebiscitos e dos referendos, independentemente do meio empregado para o registro do voto, é obrigatória a expedição de cédulas físicas conferíveis pelo eleitor, a serem depositadas, de forma automática e sem contato manual, em urnas indevassáveis, para fins de auditoria.”


Um dos argumentos defendidos é o de que a urna eletrônica não seria descartada totalmente, pois  haveria uma inclusão de outra urna com cédulas impressas depositadas pelos eleitores.


 A celeuma começou pelo presidente Jair Bolsonaro, que acusa o modelo de urna eletrônica de não ser confiável e alega que houve fraudes na votação de 2018, a mesma em que ele se elegeu.  Alega, mas nunca provou.

O TSE, por sua vez, diz que as urnas eletrônicas já fazem parte da História eleitoral do país com bastante sucesso:


Desde que foi adotada, em 1996, a urna eletrônica já contabiliza 13 eleições gerais e municipais, além de um grande número de consultas populares e pleitos comunitários, sempre de forma bem-sucedida, sem qualquer vestígio ou comprovação de fraude".  E conclui com três grandes inconvenientes do voto impresso-auditável:


" O primeiro é que ele tem mais chances de ser fraudado do que o voto eletrônico, já que pessoas manusearão os papéis. O segundo é que, a cada dois anos, será necessário montar um grande esquema logístico para garantir o transporte e o armazenamento seguro dos votos dos 148 milhões de eleitores brasileiros. O terceiro é o risco de judicialização das eleições.

Isso significa que candidatos derrotados poderão alegar fraude na votação eletrônica e pedir a contagem dos votos impressos apenas para pôr em dúvida a legitimidade da vitória dos adversários e, assim, fragilizá-los politicamente. Na época do voto em cédulas de papel, isso era comum. Só no Rio Grande do Sul, por exemplo, foram apresentados mais de 8 mil recursos à Justiça Eleitoral nas eleições de 1994. A meu ver, ainda existe um paradoxo na proposta do voto impresso no que tange ao fato de que o voto impresso sairia da mesma urna eletrônica que estaria sob suspeita. Logo, se houve fraude no eletrônico, forçosamente  frauda-se também o impresso.

Os defensores do voto impresso-auditável rebatem os principais pontos contra a PEC oriundos do TSE e das pessoas que são contra, incluindo este articulista. Sobre os elevados custos, diz o relatório da proposta, de autoria do deputado bolsonarista Filipe Barros,  que há autorização para a Justiça Eleitoral gastar R$ 1,19 bilhão destinada a questões eleitorais, sendo R$ 1,04 bilhão para investimentos. Barros destaca, ainda, que "despesas não recorrentes da Justiça Eleitoral com a realização de eleições" estão excluídas do teto de gastos. O  TSE alega que o sistema de voto impresso abre brecha para a compra de votos e de sua comprovação. "Quem comprou o voto pode ir lá conferir se recebeu o voto da composição inteira e pode combinar com o eleitor de quem ele comprou voto o seguinte: 'Você vota em mim que sou deputado e anula o de deputado estadual'. Vou pedir recontagem e vou conferir se você votou em mim mesmo e fez isso que estou mandando'", explicou Barroso, em entrevista à CNN Brasil.

O relator rebate: o parecer da PEC do Voto Impresso prevê que as impressões de voto deverão ser depositadas "separadamente para cada cargo" (o que, por outro lado, poderia atrasar ainda mais a votação e contagem). Mas o relatório ainda deixa em aberto a possibilidade de se instituir "outra forma [de evitar a comprovação da compra do voto], desde que garanta o sigilo do voto". Além disso, o texto tenta estabelecer limites a pedidos de recontagem de votos para evitar, inclusive, o risco de judicialização.

Pelo andar da carruagem, ao menos teoricamente, os defensores  do voto impresso-auditável, até então, estavam conseguindo refutar com boas explicações, e um dos argumentos mais fortes, a meu sentir, a favor do voto impresso-auditável veio do Senador Plínio Valério ( PSDB-AM ) .

 Defensor da impressão do voto, o senador Plínio Valério (PSDB-AM) afirma que a urna eletrônica não é auditável:

"Eu mesmo tive problemas nas eleições de 2002 e 2004. Eu digitava o meu número, mas aparecia a fotografia de outro candidato. Isso aconteceu em dezenas de urnas. Eu acho que ali houve problema. A população tem o desejo legítimo de saber se o voto dela é mesmo respeitado. Não entendo por que a Justiça Eleitoral não quer a impressão do comprovante do voto. Se a urna eletrônica já é confiável, por que não deixá-la mais confiável ainda?"

Mais eis que o destino colocou Bolsonaro à frente dos bois e a  PEC 135/2019 que já caminhava célere para a sua aprovação  na Comissão de Constituição e Justiça, presidida por outra bolsonarista Bia Kicis, sofreu um baque pesado quando Bolsonaro, irritado com entrevistas do presidente do TSE, ministro Luis Barroso, contra a aprovação da PEC,  botou tudo a perder, praticamente, ao afirmar que sem a impressão dos votos não vai ter eleições. E, por tabela, esculhambou com o ministro Barroso chamando de imbecil e que no final de semana passado, pós a sua motociata no RS, disse que quem defende  a redução da maioridade para crimes de estupro, como Barroso,  beira à pedofilia.

“Quem acha que não tem fraude, porque está com medo do voto impresso? Quem quer uma democracia e quer que o voto valha de verdade, tem que ser favorável. Parabéns a Bia Kicis, autora do projeto e ao Arthur Lira. Quem for contra, ou acredita em Papai Noel ou tá do lado do Barroso, ou sabe que pode ter fraude e acha que irá se beneficiar”, e arrematou:

" Se não houver voto impresso, não vai haver eleição "

A urna eletrônica é da década de  1990 e tem vida útil em torno de 10 anos. De acordo com informações do TSE,   há “camadas” de segurança que impedem a invasão por terceiros e o acesso às informações constantes no aparelho. Se houver tentativa de ataque, este provoca uma reação do sistema que “trava” o programa e impede a sua execução por alguém de fora.

No dia da votação, a urna não opera de forma conectada à internet ou ao sistema do TSE. Assim, não há como acessá-la ou tentar invadi-la remotamente. Conforme o órgão, o equipamento utiliza o sistema operacional Linux, que impede a instalação de programas que permitam a conexão com agentes externos. Mas, na prática, o bom funcionamento da urna eletrônica no dia da votação, depende da existência de energia. Se a luz for " for embora ", serão acionadas as baterias extras. As urnas eletrônicas têm baterias com autonomia de até 12 horas sem recarga, ou seja, mesmo em caso de falta de energia, não param de funcionar. Os tribunais regionais eleitorais (TREs) também têm condições de garantir a transmissão dos dados em caso de queda de eletricidade. 

Agora, em 21 de junho passado, e  durante a tramitação da PEC 135/2019, os  parlamentares que integram a comissão especial que analisa a implantação do voto impresso – foram ao TSE e conheceram  mais sobre a urna eletrônica e os sistemas a ela associados. Foi ressaltado que a votação eletrônica é totalmente auditável e que passa por diversos procedimentos de verificação antes, durante e após a realização do pleito. Grande parte das auditorias é feita em cerimônias públicas, com a participação de entidades como o Supremo Tribunal Federal (STF), o Congresso Nacional, as Forças Armadas, a Polícia Federal (PF) e os partidos políticos.

Entre os mecanismos de auditagem que compõem o sistema eletrônico de votação, o secretário de Tecnologia da Informação do TSE, Julio Valente,  destacou o Registro Digital do Voto (RDV), uma espécie de tabela eletrônica que contabiliza de forma automática e aleatória a quantidade de eleitores aptos a votar em cada seção eleitoral e o número dos candidatos por eles escolhidos. Quem trabalha nestes dias, seja mesário, fiscal, promotor ou juiz eleitoral sabe que o Teste de Integridade e o Boletim de Urna (BU) são outros métodos de auditagem pública da urna eletrônica e do resultado por ela produzido e apesar da proposta do voto impresso-auditável aproveitar a estrutura e ferramentas já existentes, a impressão do voto, traria de volta algumas fragilidades dos tempos de votação manual, como a dificuldade para fazer a custódia dos papéis. Já o processo eletrônico, originado da urna, é controlado pelo TSE e o dispositivo funciona de modo isolado, sem conexão Wi-Fi, Bluetooth ou à internet, o que impossibilita qualquer tipo de ataque hacker, roubo de informações ou distorção de dados nela contidos, ou seja, urna eletrônica já é um modelo de votação auditável, por si mesma. Não custa lembrar: Seis meses antes de cada eleição o sistema é aberto para que mais de 15 instituições, como partidos políticos, Ministério Público, Polícia Federal, universidades e entidades de classe, se habilitem para verificar os programas que serão adotados.

Após este período, os programas são lacrados e blindados, passando por mecanismos de segurança por meio de assinaturas. Estas consistem em autorizações dadas por gestores e diretores do tribunal, da Procuradoria-Geral da República e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Uma cópia fica no cofre do tribunal como alternativa para verificação. Outras são enviadas para os tribunais regionais eleitorais. Quando o software é instalado nas urnas, estas o leem e conferem as assinaturas. Apenas desta maneira a urna funciona.

A urna eletrônica busca a verdade eleitoral, como expressão da democracia. Como diz o ex presidente do TSE, Torquato Jardim, em entrevista ao Correio Braziliense:

“Voto posto, voto contado. Acabou o peleguismo e o coronelismo. Quem mais confia na urna são os candidatos”, assegura o ministro aposentado do TSE. 

A proposta de Emenda Constitucional do voto impresso tinha votos suficientes para avançar na comissão especial da Câmara, como já dito acima, mas a articulação, porém, enfrentou resistência aliada aos ataques de Bolsonaro, e agora os partidos prometem articular a rejeição da PEC com os deputados, ou até mesmo engavetá-la. Para tanto,  11 partidos  mobilizaram o encontro virtual com este objetivo e  representam 326 deputados entre os 513 integrantes da Câmara, número suficiente para derrubar a medida. Participaram dessa videoconferência de pouco mais de uma hora, em ordem alfabética, Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM), Baleia Rossi (MDB), Bruno Araújo (PSDB), Ciro Nogueira (PP), Gilberto Kassab (PSD), Luciano Bivar (PSL), Luis Tibé (Avante), Marcos Pereira (Republicanos), Paulinho Pereira da Silva (Solidariedade), Roberto Freire (Cidadania) e Valdemar Costa Neto (PL). Agora, os bolsonaristas defensores do voto impresso-auditável, dizem que só colocam a PEC em votação com garantia de aprovação.

A ironia fica por conta do fato de que, parte dessas bancadas apoia o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), principal crítico da atual tecnologia e entusiasta do voto de papel.

Quem viver, verá  !


* O autor é promotor de justiça aposentado ( MP-PI )









fontes: https://www.conjur.com.br/2021-jul-10/entenda-polemica-torno-pec-voto-impresso

https://www.gazetadopovo.com.br/republica/voto-impresso-auditavel-argumentos-contra-favor/

https://portaldosuldabahia.com.br/2021/05/07/brasil-se-nao-tiver-voto-impresso-nao-tera-eleicao-diz-bolsonaro-a-ministro-do-tse/

https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2021/07/10/interna_politica,1285437/bolsonaro-ataca-barroso-depois-de-motociata-no-rs-lei-beira-a-pedofilia.shtml

https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2021/Junho/mecanismos-de-auditoria-do-sistema-eletronico-de-votacao-sao-apresentados-a-parlamentares

https://agenciabrasil.ebc.com.br/eleicoes-2020/noticia/2020-11/agencia-brasil-explica-como-funciona-urna-eletronica

https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2021/07/4936961-torquato-jardim-aponta-que-ataques-de-bolsonaro-ao-sistema-de-votacao-afronta-lei.html

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