Teoria: prova indiciária e condenação

Sábado, 01 de Novembro de 2014

“O benefício da dúvida, conceito do qual desfrutam acusados processados em nações civilizadas, jamais significou que o julgador, no exercício do seu ofício, devesse renunciar à razão.
São precisamente os crimes sem testemunhas presenciais que melhor se prestam ao exercício da inteligência. Em verdade, a percepção pelos sentidos não é melhor do que a compreensão pelo raciocínio.
Também os indícios se prestam a demonstrar a realidade e, de acordo com a doutrina dominante, sua eficácia não é menor do que a da prova direta, razão pela qual, quando os indícios são concordantes com outras provas colhidas, a condenação estaria justificada.
Não há como se descartar indiscriminadamente a prova indiciária, circunstancial, cujo valor é o mesmo da direta, posto que reconhecida pelo sistema do livre convencimento, adotado pelo Código de Processo Penal, na lição de JOSÉ FREDERICO MARQUES, in Elementos de Direito Processual Penal, vol. 2, 2ª edição, Rio: Forense, 1965, p. 378.
No mesmo sentido: EDGARD MAGALHÃES NORONHA, inCurso de Direito Processual Penal, 3ª ed., Saraiva, 1969, nº 79, pág. 142 e ADALBERTO DE CAMARGO ARANHA, in Da Prova no Processo Penal, 3ª ed., Saraiva, 1994, XVI, 5.1, pág. 169; e JOSÉ HENRIQUE PIERANGELLI, no seu Da Prova Indiciária, RT 610/298-303.
Aliás, a respeito do inexcedível valor probante que os indícios podem apresentar, em certos casos são oportunas algumas referências doutrinárias.
Para CHRISTIANO JOSÉ DE ANDRADE, in “Dos Indícios no Processo Penal”, na revista “Justitia”, págs. 72/87 e segs., “Indício vem do latim indicare, que significa indicar, apontar, mostrar com o dedo ou por meio de um sinal qualquer, demonstrar, revelar (...) Os escritores mais antigos chamavam os indícios de testemunhas mudas”.
Realçou MITTERMAYER, no “Tratado da Prova em Matéria Criminal”, Ed. J. Ribeiro dos Santos, 2ª ed., 1909, p. 361, que “O indício é um fato em relação tão precisa com outro fato que, de um, o juiz chega ao outro por uma conclusão natural. É preciso, então, que haja na causa dois fatos, um verificado, e outro não provado, mas que se trata de provar raciocinando do conhecido para o desconhecido”.
Consoante se aquilata do teor do art. 239 do CPP, considera-se indício a circunstância conhecida e provada que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outras circunstâncias, extraídas da experiência técnica ou comum.
Destarte, pelos indícios, por presunção hominis, vai-se do fato indiciário – através de operação lógica – ao fato a ser provado, segundo os princípios da razão (id quod plerumque accidit), segundo remarcam ainda ADA PELLEGRINI GRINOVER, ANTÔNIO SCARANCE FERNANDES e ANTÔNIO MAGALHÃES GOMES FILHO, in “As Nulidades no Processo Penal”, Malheiros Editores, 1992, pág. 133.
Em outras palavras, é possível afirmar que, pela prova indiciária, alcançasse determinada conclusão sobre um episódio através de um processo lógico-construtivo, estabelecendo-se o devido nexo de causalidade.
Os indícios, desta sorte, constituem modalidade indireta de prova e diferem da prova direta porque, nesta, o fato probando obtém silhueta e contornos instrutórios imediatos, apresentando-se, como perlustra MAGALHÃES NORONHA, “diante de nós, sem necessidade do processo lógico-construtivo, porque se nos revela através do testemunho, confissão, perícia, etc (...)”. Os indícios, de sua parte, em suma, também seriam importantes para o respaldo e embasamento de uma sentença de preceito condenatório (RT 401/285, 555/114, 722/462), principalmente se afastam qualquer hipótese favorável ao acusado (RT 110/127, 214/61, 218/96, 395/309 e 401/285).
Claro que as provas de crimes desta natureza não são daquelas diretas, evidentes e que de pronto se fazem reconhecer, porquanto não são, rotineiramente, cometidas às claras, em presença de testemunhas ou mediante expedição de documentos que as evidenciem.
Ao contrário, são perpetradas às escondidas, dissimuladamente, mediante cuidados especiais, tudo de forma a não ficarem sinais visíveis do acontecimento.
Bem por isso, são circunstâncias, detalhes, indícios, que permitem ao julgador, em tais hipóteses, e ao cabo de percuciente análise dos elementos de convicção trazidos à sua consideração, concluir que se está, realmente, em presença de fatos induvidosos, graves, violadores da lei e da moral. Merecedores, por isso, de justa e severa reprimenda.
Ao Juiz sempre há de ser lícito decidir, também, por força de indícios ou presunções, na medida em que sejam eles veementes, convincentes e inconciliáveis com outra solução diversa da que venha a adotar. Equivocada, por isso, é a assertiva de que a decisão que se profira a propósito de tal ou qual fato, somente pode estar fundada e com amparo na prova direta da culpa e do fato delituoso. Bem ao contrário, tal prova, justificando o acolhimento da pretensão deduzida ou da imputação feita, pode sobrevir até por via indireta, imposta pelo bom senso e pelas características particulares do evento.
Sustentar o contrário seria consagrar a impunidade de um sem número de infrações, que reclamam reprimenda e que, não obstante sua realidade indiscutível, estão evidenciadas, tão somente, por indícios ou presunções, revelados por suas próprias características incompatíveis com outra conclusão, mas que a prova direta não logrou mostrar. E essa impunidade, sobre afrontar o real anseio de Justiça, não se concilia com a norma legal em vigor.
Como observa Malatesta, “o critério diretivo supremo para a solução do problema deve ser procurado propriamente naquela presunção genérica, que é a grande mãe das presunções específicas e particulares, e nasce do curso natural das coisas humanas. Observando que uma coisa se verifica no maior número dos casos, o espírito humano, não conhecendo se ela se verifica ou não no caso particular, sendo mais crível que em particular seja verificado aquilo que ordinariamente sucede, e não o que sucede extraordinariamente. O ordinário se presume, o extraordinário se prova; eis o princípio supremo para o ônus da prova” (A Lógica das Provas em Matéria Criminal, vol. 1, pág. 137).”
Fonte: TJSP - 7ª Câmara de Direito Criminal - Apelação nº 0058550-42.2011.8.26.0506 – Des. Rel. AMARO THOMÉ, J. 07/08/2014 – In Revista Eletrônica de Jurisprudência, Volume 04, Ano I, Jul-Ago/2014.










fonte: transcrito na íntegra
promotordejustica.blogspot.com.br
originalmnte publicado em 20/10/14

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