Artigo: " Exibicionismo é um dos quinze males que afetam a magistratura "

Sexta Feira, 09 de Janeiro de 2015

Por Siro Darlan de Oliveira
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O Papa Francisco fez uma autocrítica da Igreja Católica enumerando 15 “enfermidades” que acometem qualquer corporação ou grupo humano, afirmando que: “Uma Cúria que não faz autocrítica, não se atualiza e não tenta melhorar é um corpo doente". Podemos aplicar essa reflexão a nossa magistratura, com o perigo de causar certo desconforto àqueles que se acham acima do bem e do mal. Mas já que estamos virando o ano seria bom usar uma autocrítica análoga.
1. Sentir-se imortal ou indispensável. Recentemente foram vários casos de magistrados que se colocaram acima das leis como se não fossem obrigados a cumprir e fazer cumprir a Constituição e as leis como qualquer cidadão. E como afirma Francisco, os magistrados também são como os aviões, só são notícias quando caem.
2.  Martalismo: Lembrando a passagem da Bíblia que se refere à Marta, também os juízes são acometidos pelo excesso de trabalho e as cobranças constantes por produção que os leva ao estresse e a má qualidade dos julgamentos.
3. Dura mentalidade: Quando alguém perde a serenidade interior, a vivacidade e a audácia e se esconde atrás de papéis, deixando de serem intérpretes da lei do nosso tempo para serem meros repetidores das normas sem se dar conta que nossos julgamentos são de homens como nós somos.
4. Excessiva planificação: É a tentação de alguns administradores dos tribunais de transformar os juízes em operários do direito e contratam Fundações para aumentar a produção e o lucro. Os juízes são colocados como cobradores de taxas e impostos e se transformam numa caixa registradora. Tornam-se contabilistas.
5. Alzheimer judicial: Ocorre quando magistrados esquecem-se do artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil que prescreve que o juiz não deve seguir friamente a lei e sim atender aos fins sociais, ou seja, não deve ser apenas um juiz de direito, mas também um humanista, observando o bem comum a que a lei se destina. Nem deve se distanciar demais da realidade daqueles que julga sob pena de viver num mundo imaginário e irreal.
6. Rivalidade e vanglória: Há juízes que gostam de honrarias e tem certo apego aos degraus que devem percorrer na carreira. Portanto não se dão conta dos micos que pagam quando se submetem ao que chamamos de “beija mão e lava-pés”, ou seja, submetem-se a humilhantes pedidos a seus julgadores votantes e para isso usam de argumentos que não honram a toga que vestem. Isso ocorre pela falta de democratização dos critérios de escolha tanto dos dirigentes dos tribunais como das promoções dos magistrados.
7. Má coordenação: Ora se somos todos magistrados, qual a razão de usarmos títulos diferentes: desembargadores e juízes. Sendo parte de um único corpo, o que explica essa falta de harmonia para uma melhor funcionalidade.
8. Esquizofrenia existencial: Temos leis e a Constituição que devem ser nossoguia de trabalho. No entanto, embora tenhamos o dever de cumprir e fazer cumprir essas leis convivemos com injustiças sociais como se vivêssemos uma vida dupla, fruto de uma hipocrisia que não nos deixa ver que o sistema penitenciário é um desrespeito às leis que por descumprirem-nas mandamos para ele. Convivemos com governantes que rasgam as leis, se corrompem e corrompem promotores e magistrados e nada com eles acontece que sirva de exemplo.
9. Terrorismo das fofocas: Quase como uma decorrência da enfermidade acima, é a doença dos covardes que não tendo a coragem de falar diretamente, falam pelas costas. Tanto vale para aqueles que falam mal dos juízes sem levar a denúncia aos órgãos competentes quanto para os próprios colegas que se utilizam dessa doença para prejudicar a imagem do colega. Defendamo-nos do terrorismo das fofocas.
10. Divinizar os chefes: É a doença do carreirismo e oportunismo. São pessoas que atuam na magistratura apenas em função do que devem obter para si e não de servir através do poder que exercem. Tivemos casos de ministros que deram publicidade a sua saga carreirista ao acender uma vela para Deus e outra para o Diabo.
11. A indiferença: Pode causar um mal muito grande à vida comunitária pela perda da “sinceridade e calor das relações humanas”, e de "quando por ciúme sente-se alegria em ver a queda dos outros em vez de ajudar a levantar”. Ou ainda a indiferença com os dramas humanos que são levados a julgar.
12. Cara de enterro: O Papa chamou por esse título, mas nós podemos enquadrar pela cara de mal que fazem alguns magistrados não cumprimentando as partes, os advogados, sendo rudes e grosseiros como se estivessem na função de julgar com má vontade e não pelo prazer de fazer Justiça, como é seu dever ético.
13. Acumular bens materiais: Não é nenhuma doença acumular bens materiais, mas nós magistrados não podemos fazer usos de nossas funções para obter vantagens, como por exemplo, adquirir bens através de leilões ou outras formas que nossa função nos impede.
14. Círculos fechados: Sendo a função judicante social e comunitária não podem os magistrados viver isolados de sua comunidade, vivendo em gruposexclusivamente de seus pares porque além de afastar-se da realidade de sua cidade, de seus vizinhos e amigos, terão muita dificuldade, quando se aposentarem de serem aceitos.
15. O lucro excessivo e o exibicionismo: Ocorre quando o poder que nos foi outorgado pelo povo é utilizado para seu próprio serviço e não para servir ao povo que é o verdadeiro detento desse poder. Ou ainda quando transforma esse poder em mercadoria para obter mais ganhos ou mais poder.
É claro que, assim como o Papa Francisco fez com a Igreja, não se trata de generalizar, nem acusar esse ou aquele magistrado de ser portador de qualquer “enfermidade”, até porque acredito que em sua imensa maioria os juízes são bons, trabalhadores e honestos, mas uma reflexão dessas no início de mais uma temporada de trabalhos deve nos fazer muito bem.



* o autor é desembargador do TJ-RJ e  Coordenador no Rio da  Associação Juízes para a Democracia






fonte: Conjur
na íntegra
Imagem capturada no blog do Segadas
https://blogdosegadas.wordpress.com/
n.b: os negritos são nossos

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