Jurisprudência: Revisão " Pro Societate

Domingo, 08 de março de 2015

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO PENAL. REVISÃO CRIMINAL. PUBLICAÇÃO DE ACÓRDÃO QUE NÃO CORRESPONDE AO JULGAMENTO DO ÓRGÃO COLEGIADO. COISA JULGADA. NÃO OCORRÊNCIA. PERCEPÇÃO DO EQUÍVOCO PELO TRIBUNAL APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO. DESCONSIDERAÇÃO DA PUBLICAÇÃO. POSSIBILIDADE. SEGURANÇA JURÍDICA. LEALDADE E ÉTICA PROCESSUAIS. PRETENDIDAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DECORRENTES DE ATOS ILÍCITOS. DESCONSIDERAÇÃO. SUSPEIÇÃO DE JULGADORES. UTILIZAÇÃO DE EXPRESSÕES INADEQUADAS. CIRCUNSTÂNCIA INSUFICIENTE A CONFIGURAR PARCIALIDADE NO JULGAMENTO.
1. O processo, em sua atual fase de desenvolvimento, é reforçado por valores éticos, com especial atenção ao papel desempenhado pelas partes, cabendo-lhes, além da participação para construção do provimento da causa, cooperar para a efetivação, a observância e o respeito à veracidade, à integralidade e à integridade do que se decidiu, conforme diretrizes do Estado Democrático de Direito.
2. A publicação intencional de acórdão ideologicamente falso – que não retrata, em nenhum aspecto, o julgamento realizado – com o objetivo de beneficiar uma das partes, mesmo após o trânsito em julgado, não pode reclamar a proteção de nenhum instituto do sistema processual (coisa julgada, segurança jurídica etc.)
3. Ao sistema de invalidades processuais aplicam-se todas as noções da teoria do direito acerca do plano de validade dos atos jurídicos de maneira geral. No processo, a validade do ato processual, tal como ocorre com os fatos jurídicos, também diz respeito à adequação do suporte fático que lhe subjaz e lhe serve de lastro.
4. A manutenção dos efeitos da publicação ilícita, eventualmente pretendida pelas partes, refoge à própria finalidade da revisão criminal que, ao superar a intangibilidade da sentença transitada em julgado, cede espaço aos impetrativos da justiça substancial.
5. É bem verdade que a revisão criminal encontra limitações no direito brasileiro, e a principal delas diz respeito à modalidade de decisão que pode desconstituir. Desde que instituída a revisão criminal na Constituição de 1891, é tradição do processo penal brasileiro reconhecer – tomando o princípio do favor rei como referência – que somente as sentenças de condenação podem ser revistas.
6. A revisão pro societate, cumpre dizer, reclamaria a mesma lógica que explica a revisão pro reo, qual seja, a necessidade de preservar a verdade e a justiça material, sobretudo quando o tempo demonstra a falsidade das provas sobre as quais se assentou a decisão absolutória, de modo a comprometer a legitimidade da sentença perante a comunhão social.
7. Embora entre nós não se preveja, normativamente, ainda que em caráter excepcional, a possibilidade de revisão do julgado favorável ao réu, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal autoriza desconstituir decisão terminativa de mérito em que se declarou extinta a punibilidade do acusado, em conformidade com os arts. 61 e 62 do Código de Processo Penal, tendo em vista a comprovação, posterior ao trânsito em julgado daquela decisão, de que o atestado de óbito motivador do decisum fora falsificado.
8. Ainda que a hipótese em exame não reproduza o caso de certidão de óbito falsa, retrata a elaboração de acórdão de conteúdo ideologicamente falsificado sobre o qual se pretende emprestar os efeitos da coisa julgada, da segurança jurídica e da inércia da jurisdição, o que ressoa incongruente com a própria natureza da revisão criminal que é a de fazer valer a verdade.
9. A desconstituição do acórdão falso não significa que houve rejulgamento da revisão criminal, muito menos se está a admitir uma revisão criminal pro societate. Trata-se de simples decisão interlocutória por meio da qual o Judiciário, dada a constatação de flagrante ilegalidade na proclamação do resultado de seu julgado, porquanto sedimentado em realidade fática inexistente e em correspondente documentação fraudada, corrige o ato e proclama o resultado verdadeiro (veredicto). Pensar de modo diverso (é que) ensejaria ofensa ao princípio do devido processo legal, aqui analisado sob o prisma dos deveres de lealdade, cooperação, probidade e confiança, que constituem pilares de sustentação do sistema jurídico-processual.
10. O processo, sob a ótica de qualquer de seus escopos, não pode tolerar o abuso do direito ou qualquer outra forma de atuação que dê azo à litigância de má-fé. Logo, condutas contrárias à verdade, fraudulentas ou procrastinatórias conspurcam o objetivo publicístico e social do processo, a merecer uma resposta inibitória exemplar do Judiciário.
11. Portanto, visto sob esse prisma, não há como se tolerar, como argumento de defesa, suposta inobservância à segurança jurídica quando a estabilidade da decisão que se pretende seja obedecida é assentada justamente em situação de fato e em comportamento processual que o ordenamento jurídico visa coibir.
12. A seu turno, o emprego, por desembargador que oficiou nos autos, de expressões inadequadas ou de linguajar não compatível com a nobre função de julgar não significa, por si só, a ocorrência de julgamento parcial. A suspeição se comprova pelo laço íntimo de afeição ou de desafeição e não pela ausência de técnica escorreita de linguagem.
13. Recurso Especial não provido








fonte: Blog Promotor de Justica

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